O Impacto do Sedentarismo nas Doenças Inflamatórias
Intestinais
Sou profissional de educação física há aproximadamente oito anos e como a maioria que nos acompanha durante esse mês, também sou portador de DII, tenho Retocolite Ulcerativa há quatro anos aproximadamente, tive o diagnóstico no final de 2016, início de 2017.
A convite da Patrícia da DII Brasil, vou passar para vocês um pouquinho sobre os efeitos do sedentarismo nas DIIs. Não tem como pensar em sedentarismo sem pensar na atividade física. Sedentarismo nada mais é do que a ausência da prática de exercícios físicos regulares. Qual a diferença entre atividade física e exercício físico?
A atividade física são aquelas atividades normais do dia a dia, como levantar da cama, levantar uma cadeira, fazer uma caminhada rápida para pegar o ônibus para o trabalho ou aquela caminhada do estacionamento até o local de trabalho, ou seja, movimentando seu corpo para os afazeres do dia a dia, isso é atividade física.
O exercício físico é todo aquele que está além das suas atividades físicas. Por exemplo, se você vai ao trabalho à pé, por livre e espontânea vontade, e caminha 1, 2 ou 3 km ou vai de bicicleta, ao invés de ir de ônibus ou carro, de forma contínua, isso é um exercício físico, é tudo aquilo que você faz além das suas atividades básicas. Quando você vai a uma academia e tem o controle de tempo e de quantidade de repetições dos exercícios, um monitoramento cardíaco, tudo isso é exercício físico.
Temos também o esporte, que pode ser de alto rendimento, que tem uma outra característica, é muito mais intenso e requer um preparo físico diferente do que estamos aqui abordando. O fato de você jogar futebol duas vezes por semana, você está fazendo um exercício físico e um esporte ao mesmo tempo.
E qual é a quantidade ideal para não ser considerado sedentário? Falo sempre que pelo menos 3 vezes por semana, de 30 minutos por dia, perfazendo assim 90 minutos de exercício físico por semana, o que já caracteriza que você não é uma pessoa sedentária.
Sobre isso, têm publicações que falam em 10 minutos por dia, 50 minutos por semana; ou 30 minutos por dia, 5 vezes na semana, 150 minutos por semana, o número não é absurdo mas para quem nunca praticou nada torna-se um absurdo, porque, ou vai lesionar ou vai desanimar, ou as duas coisas. Não dá para sair do zero e começar o exercício dessa maneira. Então vamos pensar sempre em 90 minutos semanais de exercício físico para não ser considerado sedentário. Aqui não estamos contando o tempo de se arrumar para o trabalho, nem a caminhadinha rápida de 5 minutos até a parada de ônibus.
E qual o impacto que causa o sedentarismo nas doenças inflamatórias?
Todos nós sabemos, não é novidade para os portadores das DIIs que a doença não tem uma causa específica, há vários fatores, como a genética, o ambiente, enfim, ainda não temos uma causa realmente conhecida e o que acontece, que é muito comum, principalmente no início da manifestação do problema é um sangramento intenso no intestino. Então vamos pensar o seguinte: o corpo todo trabalha em conjunto, e nesse momento, eu, sentado, o corpo todo está trabalhando de uma forma ou de outra, um pouco mais de foco numa atividade, um pouco menos em outra. Eu vou citar uns números para explicar melhor.
Por exemplo, um indivíduo que não é atleta mas é muito ativo, em repouso, durante 1 minuto, o coração dele bombeia para o corpo todo, aproximadamente 5 litros de sangue. Desses 5 litros, 1 litro vai para os músculos, 1,35 litros para a região abdominal, que engloba intestino, considerando apenas o ventrículo esquerdo. Já o ventrículo direito bombeia no mesmo 1 minuto, 5 litros de sangue só para o pulmão, quando acontece a troca gasosa do da inspiração e expiração, entra oxigênio e sai gás carbônico, fazendo toda aquele processo de circulação já sabida pela população, levando oxigênio para o corpo inteiro.
Saindo do repouso e fazendo exercício, o coração, durante o exercício de 1 minuto, ele bombeia, o que antes eram 5 litros no repouso, agora vai para 25 litros aproximadamente, ou seja, 5 vezes mais. Que diferença!
Mas um detalhe, desses 25 litros, aproximadamente 20 litros vão só para os músculos, só para a parte periférica, porque aquilo que estou fazendo, correndo, andando de bicicleta, nadando, fazendo musculação, os músculos estão sendo recrutados. Aí você pergunta, e os 1,35 litros do intestino? Agora ele diminui para apenas 300 ml de sangue durante o exercício.
E o que isso pode acarretar? Podemos dizer que depois do exercício temos um tempo de carência em que o corpo está no processo de resfriar, é como se o forno estivesse ligado e leva um tempo para esfriar depois de desligado, ou o motor de um carro que demora para esfriar. O corpo humano esfria mais rápido, porém ele continua trabalhando, porque você deu aquele estímulo e ele ficará ativo por mais tempo. Se for um indivíduo que está começando agora a fazer exercício, que saiu do sedentarismo, está fazendo exercícios 3 vezes por semana, durante 30 minutos, o corpo vai se acostumando gradativamente e ao longo do tempo esse tempo de esfriamento será bem menor, até o corpo voltar ao natural, só que o corpo ainda vai colher os benefícios, ou seja, vai continuar queimando gordura que você estimulou, então você gerou aquela queima de energia e continua usando o combustível para queimar energia, para gastar essa energia. E o mesmo acontece com a respiração, então como recebemos o sangue via bombeamento cardíaco, aqui na região intestinal, ele vai rico em oxigênio.
Então pensa agora: você se exercitou, seu corpo recebeu mais oxigênio e quando a gente se exercita recebe muito oxigênio. Em repouso, seu corpo já recebe muito oxigênio, a cada 100 ml de sangue, são 5 ml de oxigênio e durante o exercício físico essa quantidade aumenta para 18 ml de oxigênio para cada 100 ml de sangue.
Então, pensamos em alguém que saiu do sedentarismo e serão pelo menos 30 minutos em que, até mesmo o intestino vai ser mais bem nutrido de oxigênio através do sangue, e isso é muito benéfico. Os atletas de ciclismo e corrida, maratonistas, eles utilizam da altitude das cidades para melhorar seu desempenho, isso faz com que o sangue fique cada vez mais oxigenado, melhorando seu desempenho.
Levando em consideração as pessoas portadoras de doença inflamatória intestinal, com momentos de remissão e de crise, é muito importante entender que no momento da crise é importante não praticar exercícios ou reduzir o tempo, porque quando o corpo voltar do exercício para o repouso, ele irá receber uma grande quantidade de sangue, e poderá acontecer algum desconforto ou sangramento, mas o exercício sempre é bem vindo, analisando sempre a sua condição no momento.
Existem estudos que falam em 60 minutos de exercícios aeróbicos durante 3 dias da semana, ou 20 a 60 minutos de 2 a 5 vezes na semana, sem contar os exercícios de força e musculação, que são mais duas vezes na semana. O importante é fazer o exercício que mais gosta, uma caminhada, uma corrida que são os aeróbicos, os de força, não esquecendo que os que causam maior impacto, os aeróbicos ajudam no processo de reabsorção do cálcio, sem falar dos fatores alimentares, pensando apenas em um dos problemas das DIIs, que é a perda de densidade mineral óssea ao longo do tempo, surgindo no futuro a osteoporose.
Para evitar isso é essencial que se faça pelo menos uma caminhada, uma corrida, ciclismo ou natação. Os dois primeiros geram mais impacto, mais movimento, já os dois últimos menos impacto, mas o importante é que você se movimente regularmente. A musculação ajuda a manter a massa magra em atividade.
Os estudos também mostram que dentre os benefícios já conhecidos, após o exercício, como emagrecimento, o ganho de massa muscular, que aliás, a perda de massa muscular é outro problema a longo prazo principalmente nas doenças inflamatórias intestinais, que podem causar a sarcopenia. Ela ocorre quando você perde massa muscular e perde também a capacidade de ganhar massa muscular. Lembrando que a alimentação tem que estar inteiramente ligada aí, que associada ao exercício físico fará com que você ganhe massa muscular e densidade mineral óssea.
Além desses outro benefícios do exercício físico para os portadores de DIIs são: prevenção do câncer de cólon, cujos pacientes com DIIs tem 50% maior de chances que adquirir esta doença, tanto homem como mulher, do que indivíduos não portadores de DIIs; previne doenças diverticulares, redução da constipação intestinal, redução do cálculo biliar e redução da hemorragia gastrointestinal.
Voltando um pouco aquilo que eu mencionei, para quem está numa crise de DII, a gente sabe que acontece aquelas hemorragias, sangramentos que parecem sem fim, mas se está fazendo exercício físico, com o tempo o corpo acostuma e o tempo de sangramento tende a diminuir. Não sei afirmar se chega ao ponto de cessar o sangramento, mas volto a dizer, os médicos da área são muito mais qualificados para dizerem sobre esses detalhes. Mas segundo artigos e pela minha experiência profissional isso é totalmente possível, exceto nos casos especiais, nas crises agudas ou no momento em que o indivíduo está saindo do sedentarismo e começou a se exercitar.
Ser sedentário não quer dizer que você não tenha qualidade de vida. Mas um indivíduo que se alimenta bem, toma os devidos cuidados a respeito da doença inflamatória e ainda complementa com a prática dos exercícios, entende-se que ele é um indivíduo que nesses aspectos, está com uma melhor qualidade de vida. Claro que isso depende de vários fatores, como psicológicos, o seu ambiente de trabalho e de casa, mas trazendo para a questão da saúde, do exercício físico, podemos considerar que juntando esses fatores, ele é um indivíduo com melhor qualidade de vida.
Para concluir, viver uma vida sedentária não será boa para quem é o portador de doença inflamatória intestinal, porque se, só com o exercício físico já se reduz a hemorragia intestinal e risco de doença no cólon, já são dois motivos básicos para gente sair da inatividade e começar a praticar exercícios. São duas coisas que afetam muito os pacientes com DIIs.
Não sei precisar quantos pacientes de Retocolite Ulcerativa ou de Doença de Crohn ficam doentes pelo câncer de cólon, mas considerando os casos de hemorragia são unanimidades. Então, se com exercícios se consegue a redução disso já é um grande fator para a prática de exercícios e pensando no que mencionei no início, falando do transporte de oxigênio no sangue e quanto os órgãos ficam irrigados durante e pós exercício, quanto mais enriquecido de oxigênio, principalmente no intestino, para os portadores, mais benefícios o organismo terá.
Relembrando então, para aqueles que pretendem sair do sedentarismo e melhorar sua qualidade de vida, lembra daquele básico: 3 vezes na semana, 30 minutos cada dia, então 90 minutos por semana de exercício está ótimo, pode ser uma caminhada, já está ótimo, não esquecendo do que falei do que o exercício físico ajuda a prevenir. Podemos conviver bem com as DIIs , mas podemos conviver bem melhor, se sairmos do sedentarismo, então vamos lá.
Espero que tenham gostado, que tenha sanado algumas dúvidas e foi um prazer enorme falar com vocês!
Texto extraído da vídeo-aula ministrada pelo Sr. Róberson Souza, no evento Maio Roxo 2020. Róberson é profissional de Educação Física, licenciado e bacharel pelo Centro Universitário Ítalo Brasileiro em São Paulo; Especialista em Fisiologia do Exercício e Prescrição do Exercício pela Universidade Estácio de Sá/Gama Filho em São Paulo; Membro do Comitê de Esportes da DII Brasil e portador de Retocolite Ulcerativa.