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Doença hepática gordurosa associada ao metabolismo e fibrose hepática em pacientes

A doença hepática gordurosa associada ao metabolismo (DHGAM) é a principal doença hepática em pacientes com doença inflamatória intestinal (DII), acometendo cerca de 8-88% dos indivíduos. Os fatores de risco que levam ao desenvolvimento de DHGAM em pacientes com DII são ainda controversos. Dessa forma, Rodriguez-Duque e colaboradores avaliaram a prevalência e os fatores de risco associados ao diagnóstico de DHGAM e fibrose hepática em uma grande coorte de pacientes com DII, e em subgrupo de pacientes com DII e DHGAM confirmada por biópsia.

Metodologia

O estudo, que incluiu, consecutivamente, pacientes com mais de 18 anos e diagnóstico de DII em dois diferentes hospitais da Espanha. Pacientes controle foram selecionados aleatoriamente na população geral e pareados por idade, sexo, diabetes tipo 2 e índice de massa corporal na proporção de 1:2. O diagnóstico de DHGAM foi confirmado pela presença de esteatose hepática aferida pelo parâmetro de atenuação controlada (maior que 248 dB/m) associada a índice de massa corporal (IMC) ≥ 25 kg/m², diabetes tipo II ou desregulação metabólica. Biópsias hepáticas foram realizadas em pacientes com suspeita de DHGAM e fibrose hepática significativa pela elastografia (≥ 7,2 kPa). Além disso, pacientes sem DII e com DHGAM confirmado por biópsia, pareados por idade e estágio de fibrose, foram incluídos como grupo controle secundário. Indivíduos com evidência de malignidade ou outra causa secundária de hepatopatia crônica foram excluídos.

Resultados

Dos 1.651 pacientes com DII avaliados, 1.012 concordaram em participar do estudo. De uma amostra de 2.024 pacientes controle, 1.718 preencheram o critério de inclusão no estudo. A DHGAM foi mais prevalente em pacientes com DII que na população geral (42% x 32,77%; P < 0,001). A prevalência de comorbidades metabólicas, como sobrepeso ou obesidade, diabetes tipo II e hipertensão foi significativamente menor em pacientes com DII e DHGAM do que em controles com DHGAM. Apesar disso, pacientes com DII e DHGAM apresentaram rigidez hepática média maior que os controles e maior proporção de indivíduos com suspeita de fibrose avançada (9,45% vs 2,31%; P < 0,001). Por outro lado, a mediana  do parâmetro de atenuação controlada foi mais baixa nos pacientes com DII.  Em análise multivariada, a presença de DII (OR 1,999; IC95% 1,592–2,511), além de IMC elevado (OR 1,337; IC95% 1,295–1,381), idade avançada (OR 1,037; IC 95% 1,026–1,048), sexo masculino (OR 1,561; IC95% 1,248–1,951) e presença de dislipidemia (OR 1,284; IC95% 1,008–1,636) foram fatores de risco independentes para o diagnóstico de DHGAM. De maneira semelhante, fatores de risco metabólicos bem estabelecidos, como IMC elevado (OR 1,145; IC95% 1,069–1,204) e diabetes mellitus tipo 2 (OR 3,301; IC95% 1,444–7,550), além do diagnóstico de DII (OR 5,550; IC95% 2,687–11,465) foram associados a presença de fibrose avançada na DHGAM.

Pacientes com DII e DHGAM, quando comparados a indivíduos com DII sem DHGAM, foram significativamente mais velhos, com predomínio de homens, obesos, com aumento da circunferência abdominal e maior prevalência de diabetes tipo II, hipertensão e dislipidemia. Pacientes com DII-DGHAM tiveram o início da doença intestinal mais tardio, maior duração de doença e maior prevalência de complicações graves, como megacólon tóxico. Não foram observadas diferenças relacionadas ao fenótipo, atividade de doença e uso de medicamentos. Em análise multivariada, a história de complicações relacionadas a DII, idade avançada, alto índice de massa corporal foram fatores independentes para o diagnóstico de DHGAM. Por outro lado, o diagnóstico de doença de Crohn (OR 2,989; IC 95% 1,152–7,754), história de complicações relacionadas a DII (OR 2,541; IC95% 1,042–6,200) e IMC elevado (OR 1,144; IC95% 1,064–1,229) foram preditores independentes de fibrose avançada.

Biópsia hepática foi obtida de 40 pacientes com DII, DHGAM e suspeita de fibrose significativa. O diagnóstico de DHGAM foi confirmado histologicamente em todos os casos e algum grau de fibrose observado em 62,5% dos pacientes. Presença de fibrose avançada (F3 e F4) foi encontrada em 15% dos indivíduos biopsiados. A prevalência de diabetes tipo II e os valores de IMC foram menores em pacientes com DII e DHGAM, em relação aos pacientes controle com DHGAM confirmada por biópsia, pareados por estágio de fibrose. Além disso, o grau de esteatose foi menor no grupo com DII nas análises histológicas. Os escores não invasivos FIB4, APRI, NAFLD fibrosis score e FLI apresentaram boa acurácia na avaliação de fibrose avançada para os valores de corte de 1,30, 0,70, –1,455 e 60, respectivamente, com valor preditivo negativo maior que 90%. A elastografia hepática também demonstrou excelente performance com área sob a curva de 0,93 e valor preditivo negativo de 100% para o corte de 9,5 kPa.

Conclusões

Trata-se do maior estudo a avaliar características de DHGAM em pacientes com DII. O estudo demonstra que a DHGAM é significativamente mais prevalente em pacientes com DII que na população geral e que a DII é um fator de risco independente não só para DHGAM, como também para evolução com fibrose hepática. Dessa forma, esse trabalho destaca a importância do rastreamento ativo de DHGAM na população com DII, especialmente em pacientes com doença de Crohn, e confirma a acurácia de testes não invasivos na avaliação de fibrose hepática nesse contexto.

Artigo do Dr. Guilherme Cançado Grossi, membro do Conselho Científico da DII Brasil, no site PEBMED.